segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Primeira vez


Já se passaram 9 meses, e parece que um sentimento novo está nascendo. O velho ‘home sweet home’ começa a dar sinais, as paredes já começam a falar com você, os lugares visitados diariamente já são familiares, as pessoas já não são mais os totais desconhecidos e o mato sem cachorro está povoado de outros animais, não tão dóceis quanto os cães mas nem por isto menos apreciados.

Um olhar embaçado começa acomadar sua visão fazendo com que, o que antes era inusitado e surpreendente, seja agora algo injetado e fluidificado nas suas veias, numa leve dormência. Isto parece bom à primeira vista, mas a quietação é perigosa quando se vive num mato sem cachorro.
Mas então você reage e entra naquele estado curioso de procurar o novo, o que vai lhe tirar do chão novamente e fazer caminhar diferente; o que vai lhe exigir paradas forçadas para não perder o que cruzou no caminho e que deu taquicardia. E aí, então, você mostra que está pronto, e num ato impulsivo e imediato, puxa a arma e atira.

Foi outro dia, pedalando pela Avenida Carajás, na expectativa de encontrar a onça pintada que um amigo nosso havia visto a menos de dez metros de distância, e que me fez pensar no quão expostos estamos, apesar de todo o rigor e obsessão da segurança local, mas que nem por isto me fez temer um possível encontro. Foi outro dia, pedalando pela Avenida Carajás que me deparei com algo preto de quatro patas peludas atravessando calmamente como se fosse o dono da avenida.

Se você está pensando em encontrar uma onça no caminho, qualquer coisa parecida com ela, será a própria, pintada ou não, ela será sua onça. Temos que aceitar que nossa realidade é feita de imaginação e que por isto podemos reinventá-la a cada dia, mas também podemos nos decepcionar a cada dia.

Foi o que aconteceu. Depois de tentar frear o coração que bateu forte para arrebentar o peito, saquei minha câmera fotográfica e meio trêmula ainda, atirei uma foto no guariba. Preto, preto, dono de si, olhou para os lados me descobrindo e como quem sabe que passam carros por ali, depois olhou para frente e, decidido, logo em seguida subiu numa árvore com a destreza primata.

Fui ao seu encalço e ainda armada, saquei novamente uma foto dele entre as folhas, mas ele não me deu bola e olhava em outra direção procurando talvez uma companhia.

No fim da tarde ou pela manhã é muito comum ouvirmos os gritos, grunhidos, conversações, ou lá o que seja aquilo que os guaribas fazem do alto das árvores. A primeira vez que ouvi foi quando percebi que a macacada parece reinar no pedaço e que do alto de suas torres nos observam, talvez fazendo pouco caso de nós: “Sobre duas pernas? Que andar sem graça destes ex-primatas!”.

Depois disso tive outras experiências pedalando pelo núcleo, mas nenhuma delas tão excitante, e por isto continuo limpando minhas lentes para um próximo encontro, quem sabe a onça apareça em 2010!? Quem sabe minha imaginação continue me reinventando por aqui? Quem sabe eu continue vendo coisas pela primeira vez? Quem sabe ...

domingo, 6 de dezembro de 2009

E no meio do caminho ...

Testemunhos de rocha organizados em caixas de madeira

Vistas de uma das cavas da antiga mina de Igarapé-Bahia



Magnetita presa ao ímã de uma caneta

Testemunho de rocha

Há convites irrecusáveis, e um deles veio de repente e imediatamente eu disse SIM.
Sábado de manhã bem cedo saímos de casa depois de acordados pelo turbilhão de água que caía dos céus, nos lembrando mais uma vez que a estação chuvosa bate à porta continuamente e com a força de quem quer derrubá-la. Acho que já contei que neste mato sem cachorro chove canivete, foice, enxada, ancinho, marreta, tudo de uma vez só. Chove a cântaros (wow, caiu muito bem esta expressão)!!!

Nos vestimos, tomamos café e aguardamos a chegada de nosso guia. O principal propósito era olhar alguns testemunhos de rocha e tornar crível que a 100 km de Carajás, numa antiga mina de ouro desativada, as chances de uma nova mina de cobre não eram nem um pouco remotas. Entre dois geólogos, amigos de longa data, dentro de uma super caminhonete recheada de EPI (equipamento de proteção individual), minha pessoa não parava de levantar questões ao longo da estrada que corta as grandes cavas da mina de ferro e rasga a densa floresta amazônica.

Como não aproveitar dos dois experts in rocha, guias perfeitos nesta incursão nas entranhas da Terra?

O tempo estava nublado e a dúvida sobre se era apenas neblina ou fumaça das queimadas ainda comuns nesta região, pairava no ar. Os buracos na pista vermelha (presença marcante do ferro), faziam nossos esqueletos pularem no limite de nossos cintos de segurança. Atentos esperávamos que alguma onça preta, parda ou pintada aparecesse para nos presentear os olhos. Mas não descansávamos os ouvidos daquela conversa sobre depósitos, minas, viabilidade, smelters, investimento, projetos, etc, etc, etc.

O verde nos acompanhava sem descanço, floresta virgem de vez enquanto mostrava-se muito presente na forma de árvore caída transversalmente na estrada. Felizmente alguém já haviam aberto passagem possibilitando acesso fácil. Mas percebi que há sempre surpresas nesta região inóspita, onde o geólogo insiste em adentrar e romper a linha tênue que nos separa da nossa natureza primitiva.

Finalmente chegamos a antiga mina de Igarapé-Bahia (ouro), hoje projeto do Alemão (cobre) e pra minha surpresa, lá estava, como nos filmes de faroeste americano, não uma cidade fantasma, mas uma mina fantasma. Pude sentir os fantasmas rondando, operando máquinas, trabalhando nos escritórios, detonando cavas, subindo e descendo rampas em seus caminhões gigantes, num ininterrupto movimento típico da atividade mineradora.

Imaginei que os fantasmas, ainda vivos, e agora perambulando por minas em atividade, se voltassem a Igarapé-Bahia, iriam rewind a fita de suas vidas e quem sabe se emocionar com o passado. Passado ainda muito presente e vivo pois a natureza deu um jeito de preencher as grandes cavas com água verde, profunda, virgem, formando um cânion com encostas serrilhadas, marca indubitável de que um dia uma mina esteve aqui. Um espetáculo criado pelo homem em parceria com a natureza!

Começamos nossa viagem de volta e eu já considerava meu dia ganho, quando no meio do caminho tinha uma ... E esta é uma postagem a parte, mas que se dará na forma de vídeo, pois a câmera saltou de minhas mãos e registrou o feito de nossos geólogos. http://www.youtube.com/watch?v=pGRYALhv2ts

Mais que depressa eles removeram outro obstáculo nesta aventura por um simples olhar de testemunho de 400 metros de profundidade, cheio de calcopirita, bornita, magnetita, e outras itas mais que não me lembro o nome. Me lembro sim da sua beleza, o que talvez seja o mínimo diante da infindável busca geológica neste nosso PLANETA AZUL, verde, vermelho, preto, amarelo, branco ...

Voltamos ainda a tempo de preencher o único vazio restante, nosso estômago que agora dava sinal de vida.