sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Bela Surpresa

9 de Dezembro de 2012
Por achar que tudo por aqui anda muito devagar, meio que esqueço do que está em processo de realização.  Mas hoje tive uma prova de que as coisas acontecem, só é preciso esperar com paciência.

Talvez eu ainda não tenha entrado nesse ritmo verde. Eu tento, mas algo me leva pra outros mundos em busca de realizações mais imediatas, de prazos mais curtos. Às vezes me acho ansiosa, inquieta demais, um peixe fora d’água neste planeta amazônico, e então me forço a entender que preciso desacelerar e aproveitar o que esta realidade oferece.

Pois, então, estou sempre à procura do que me ajude a entender do valor das coisas locais e que me façam rever certos pensamentos e atitudes limitantes. Seja um evento de música, participação em grupos culturais, atividades na escola, competições no clube, encontro com indígenas, conversas com antigos moradores, idas ao cinema, festas comemorativas, e até, por que não, bate-papo com as manicures no salão de beleza.

Estou de cabeça aberta, pronta pro novo - que demora a chegar, pronta pro velho - muitas vezes difícil de engolir. E assim vou tentando chegar a um estado de satisfação, mesmo que passageiro.

Recebi o convite da inauguração do Centro de Visitantes do Parque Zoobotâncio, e  não tive altas expectativas, como já disse,  já estou meio vacinada, mas fiquei surpresa com o resultado da obra. Um prédio grande, bem realizado, com auditório, sala para biblioteca, sala com a antiga coleção de insetos e sementes muito bem organizada, e outros ambientes que imagino que servirão para exposições e eventos futuros.

Fiquei imaginando que poderíamos aprender muito naquele local, além de termos a possibilidade de encontrar pessoas e garantir o lazer do fim de semana (tudo por aqui é muito restrito e repetitivo). Acredito que nosso crescimento como comunidade e como indivíduos ganharia um plus, ou melhor, seria o plus que tanto necessitamos para continuarmos nos sentindo vivos e plenamente integrados neste mundo verde. 

Da minha parte, continuarei dando apoio, divulgando e principalmente participando de tudo que me fizer entender dessa nossa “ilha da fantasia”.













domingo, 30 de setembro de 2012

Cavernas

Sempre atrás de conhecer coisas da região, depois de três anos e meio morando por aqui, descobri Filho, um ambientalista que trabalha em parceria com o ICMBio/IBAMA e já mapeou alguns pontos de interesse como cavernas e cachoeiras na FLONA Carajás. Hoje ele nos levou para conhecer algumas cavernas na savana. São mais de mil mas pudemos apreciar a beleza e aprender um pouco de três delas. As imagens falarão por mim.







E agora que já temos a pessoa certa pra nos guiar neste planeta verde, que venham mais cavernas, cachoeiras, savanas, cangas, ipomeas, onças, arpias, gaviões, corujas, e outros bichos mais. A floresta que nos aguarde! Acho que começo a gostar daqui...

domingo, 2 de setembro de 2012

Nova era?

Ontem me perguntei sobre estarmos vivendo novos tempos em Carajás. Alguns fatos tem me feito achar que a coisa pode estar melhorando por estas bandas de cá.

Numa manhã, por exemplo, consegui que meu jardineiro fizesse todo o jardim. Cortou toda a grama, tirou os "matinhos"dela e da calçada, varreu todo o resto de folhas que ficou da troca da cerca nova, e o que mais? Nada mais, pois venho preparando este jardim por três anos para que a simplicidade me ajude na lida com estes profissionais, que cá entre nós, não são dos mais dedicados e talentosos. Com isto posso dizer que atingi um objetivo: bem estar com o mínimo de esforço. Talvez alguns dirão que perdi o prazer da beleza das flores, ou do cultivo de plantas diversas, mas o que tenho a dizer é que nunca foram estes os meus maiores prazeres e como estamos por aqui só de passagem não gostaria de repetir o que exercitei por tanto tempo na Bahia: árvores frutíferas que deram muitos frutos e flores que continuam florindo o jardim até hoje (tenho notícias de nossa velha casa em Teofilândia).

Na mesma manhã, instalaram a nova internet, WKVE. Isto mesmo, agora temos internet a cabo e que pode atingir até 1 Mega de velocidade. Isso não é surpreendente? E mais... eles conseguiram fazer o serviço em menos de meia hora. E mais... eles conseguiram instalar o serviço em muitas casas em menos de uma semana, posso perceber pelos vários fios brancos que agora cruzam as ruas, dos postes aos telhados das casas, conectando todos ao mundo lá fora. Isto não é o máximo?  E mais... a velocidade é o que prometeram mesmo! No nosso caso, optamos por 600 kbps pra testar o serviço, e não é que já estamos pensando num upgrade pra 1 Mega?

No mesmo dia, já a tarde, participei do ensaio do Grupo Kuarup, do qual faço parte, apesar de meus talentos e minha paciência estarem bem aquém do necessário. O ritmo dos ensaios sempre me deixou um pouco desanimada. O constante atraso, a desorganização instalada, a falta de objetividade dos dirigentes, e talvez meu ainda distanciamento desta cultura tão diferente da dos sul-maravilhenses, fizessem de mim um ser ainda  desalmado. Mas nesta tarde parece que alguma coisa aconteceu no meu cérebro e as conexões começaram a responder positivamente, eficientemente, alegremente, animadamente e percebi que todo esforço até ali tinham valido a pena. A voz saiu forte, afinada, os arranjos fluiram e a back vocal aqui mostrou pra que veio e porque resolveu mais uma vez ficar.

Temos várias apresentações marcadas. Hoje, inclusive, participaremos da FAP (Feira Agropecuária de Parauapebas). Mês que vem estaremos num dos palcos do Círio de Nazaré em Belém, recebemos convite do governo municipal e estamos todos muito motivados. Ah! Esqueci de falar que ontem desfilamos na Parada de Sete de Setembro. Foi um luxo só! Momentos de celebridade!

Parece que tudo começa a fazer mais sentido e, óbvio, a música mais uma vez me pega na esquina e me faz escolher o melhor caminho. Já até penso com tristeza no dia em que tiver que deixar este grupo.

Outra coisa acontecendo por aqui é a construção de novas casas. Por conta do aumento do número de minas nos arredores, mais casas são demandadas para empregados que chegam. E para minha surpresa, as obras estão de vento em poupa, e já imagino as belezuras que preencherão os terrenos vazios de muitas das ruas.

Outro dia caí de quatro quando vi que a entrada de nossa horta comunitária estava tomada por asfalto. Por conta do canteiro de obras da empresa responsável pela construção das casas, estar instalado próximo daquele local, resolveram arrumar a rua pra facilitar a entrada dos caminhões e tratores. A horta que fica no fim da rua recebeu então o pavimento preto. Haverá controvérsias sobre o resultado, mas afirmo que não devemos negar o progresso e que a atmosfera rural e bucólica de outrora vai fazer parte apenas de nossas memórias porque agora já falamos em ampliação e melhoramento da hortinha.

Pois bem... Vou ficando por aqui porque nunca antes na história deste núcleo se viu tantos progressos. É óbvio que falo por mim mesma, numa percepção de alguém que ainda continua querendo ver as coisas acontecendo, e porque continua sempre se sentindo a 129 passos do paraíso.














terça-feira, 8 de maio de 2012

A 129 passos do mar e do mato

Outro dia me peguei pensando que tenho uma posição privilegiada, pois estou de frente pra dois paraísos tropicais. Se desço o elevador e abro o portão do meu prédio, estou de frente pro mar de Ipanema, se abro a porta de casa em Carajás, estou de frente pra Amazônia. Isto não é o máximo! Será que posso registrar no Guinness?

Se caminho pelo calçadão encontro banhistas, surfistas, ciclistas, caminhistas e até celebridades. Vejo gaivotas, pombas, e passarinhos pousam na minha janela.

Se caminho por Carajás encontro cotias, quatis, ouço macacos, araras, maritacas e muitos passarinhos, um especialmente interessante que assovia "fiu-fiu" quando passo, é o Peito-de- aço imitando Vinícius nestas terras distantes e verdejantes. Ai que ilusão boa!

Mas outro dia vi foram as celebridades carajenses, nossos índios Xincrins, muuuuuitos, mas muitos como ainda não havia visto. Vieram para comemorar o dia deles, 19 de abril. Dançaram, cantaram, trouxeram seus filhos e esposas e numa grande festa ainda se deixaram fotografar (coisa difícil de conseguir).

Pois é.. mas voltando aos números, ontem conferi os passos que me aproximam destes dois mundos distintos, são igualmente 129, incrível coincidência! Pro mar ou pro mato, tenho apenas que caminhar um pouco mais de uma centena de passos, acho que isto deve significar alguma coisa, mas ainda não sei o quê, então, por enquanto, vou tentado caminhar cheia de graça?, num doce balanço.

quinta-feira, 12 de abril de 2012

A maré tava mesmo era pra peixe











Água, mais água, mais e mais, mas muuuuuuuita água, ninguém do sul maravilha tem noção de quanta água este Pará tem. Será este o Planeta Água cantado pelo Guilherme Arantes? Pois bem, estivemos no Marajó. Por favor não me corrijam, por aqui não se fala "estivemos na Ilha de Marajó". Na, na, ni, na, não. Se fizer isto, será corrigida imediatamente por um nativo ofendido que lhe colocará nos trilhos marajoaras.

Já havia algum tempo que pensava em visitar aquele recôndito destino. Sim, digo isto porque nunca havia ouvido alguém dizer que tinha ido passar férias ou aproveitar o feriado no Marajó, ou na Ilha de Marajó, se preferirem. O lugar é loooooonge, a gente tem que ir até Belém, que para os paulistas, cariocas, ou qualquer outro habitante deste imenso Brasil, é lugar que não consta dos principais pacotes turísticos e que fica no extremo norte deste país gigante, sendo assim, as passagens aéreas são muito caras, então é melhor ir pra NY, pensam muitos.

Em Belém se pega uma barca às 6.30h da manhã (ainda era noite quando chegamos ao porto). A viagem dura 3 horas e a barca vai singrando as águas barrentas da Baía de Guajarás até a Baía de Marajó.

Opa! Chegamos! Porto de Camará! Não, ainda não, pegamos então um micro-ônibus que nos levará até Soure, a principal cidade da ilha e onde ficaremos hospedados. Mais 38 km de estrada e uma travessia de balsa. Ufa! Finalmente chegamos ao "O Canto do Francês". Pois é... lá está escondido Thierry, este francês que a 8 anos está ilhado do mundo, tocando sua pousada de pés descalços e com um português picado e tímido. Mas que chef! Preparou comida deliciosa com estética e porção francesa que fizeram do filhote e da dourada, os peixes mais santos de toda a Semana Santa.

Deixamos as malas no quarto, almoçamos e nos preparamos para o que seria o primeiro passeio. Digo SERIA, porque convenhamos, passear por uma fazenda de búfalos com diversas interrupções por animais peçonhentos e mamíferos extremamente sensíveis por conta dos filhotes recém paridos, não é bem um passeio mas uma aventura.

A Fazenda Bom Jesus é muito linda, quilômetros e quilômetros de área plana alagada, um cenário que até a Globo descobriu e tirou proveito para sua novela das seis. Mas não se engane, o romantismo logo se vai quando você percebe que o guia do "passeio" está nervoso e assustado com aquela búfala que lhe encara com a determinação de um guerreiro que promete lhe enfiar os chifres caso você decida passar entre ela e sua cria.

Olhei ao redor e não havia nem uma árvore pra poder subir, caso a dita cuja resolvesse correr atrás do inimigo. Era água pra todo o lado, pois estávamos num caminho elevado feito pelo fazendeiro para possibilitar mobilidade na fazenda. O guia diz pra nos afastarmos e começa a gritar "Vai te embora", firme, com sotaque vaqueiro e força macha. E depois de alguns minutos de troca ostensiva de olhares, a búfala se retira em direção a seu filhote. Ficamos sabendo então que nunca se deve passar entre uma búfala e sua cria, sob a pena de sofrer uma corrida e depois muitas chifradas que poderão lhe levar desta pra outra vida.

Depois de algumas paradas pra gritar "Vai te embora", sim porque haviam várias búfalas paridas na fazenda, o resto do "passeio" foi para apreciar o bicho preguiça na árvore, ou a cobra que passou tão rápida na água que só o guia viu, ou então, o jacaré que imaginamos no fundo do alagado, só no verão ou à noite pode ser visto. Ah! Conhecemos o sarará, crustáceo responsável pela cor vermelha dos Guarás. Estas aves típicas da região, ficam vermelhas por comerem sararás que tem alto teor de betacaroteno. Chegamos até o "retiro", lugar onde mora o vaqueiro que toma conta do rebanho de búfalos. Lugar muito simples, sem energia, com água de poço. Ouvimos ao fundo um som de rádio e nada mais. Silêncio absoluto nesta paisagem onde água e búfalos formam um par perfeito. Não tem pra mais ninguém, já se tentou criar gado por aqui mas é inútil, pois só quem gosta de se encharcar nestes alagados é o búfalo. Trazido da Índia no final do século passado, o búfalo se adaptou tão bem na ilha de Marajó que hoje seu rebanho é considerado o maior do país. São quatro as raças: Mediterrâneo, Murrah, Jafarabadi e Carabao. Os chifres mostram as diferenças de raça, pelo menos pra mim que só lembro daquela búfala enfezada no meio do nosso "passeio" preparando as armas.

Fechamos o passeio com um lindo por do sol, remando uma pequena canoa entre as águas da maré que subia e ao som de muitos pássaros, agora meus conhecidos. E não foi só, uma lua cheia do outro lado fazia gol, e acabamos num empate maravilhoso de astros.

No dia seguinte, outro "passeio" nos aguardava. Fomos conhecer a Fazenda São Jerônimo, famosa por ter guia e estrutura turística própria. Começamos numa carroça puxada à búfalo e acabamos numa canoa cheia de folhas de mangueiro, vegetação de mangue arrancada na luta pela sobrevivência enquanto subíamos um igarapé contra a corrente. Segunda aventura da temporada.

Tudo bacana. Caminhada pelo manguezal da fazenda, lindas árvores de raízes aéreas, caranguejos, aranhas caranguejeiras, formigas, pés dentro d'água, tropeções, perdi a tampinha da minha câmera, macaquinhos, etc, etc, etc. Chegamos ao igarapé e é hora de subir o igarapé numa canoa estreita movida a dois remos. Oito pessoas mais dois remadores e lá vamos nós, felizes e tranquilos, achando que a felicidade existe. Até que entramos pelo cano, quero dizer, pelo igarapé de águas torrentes, ou seja, correnteza suficiente pra impedir de mover a canoa com remos. Voltar? Nem pensar, segundo o guia, correríamos o risco de acabar na Baía, quiça no mar. Deriva total.

Caramba! A alternativa era nos agarrarmos à vegetação da margem, os mangueiros, e puxar com força pra vencer a correnteza. Simples assim. Apavorante assim. Hilário assim. Pois foi deste último jeito que decidimos encarar os fatos. Muitas piadas pra distrair e aliviar a tensão, muita força e garra pra segurar os mangueiros, muito equilíbrio pra não deixar a canoa virar (e eu só lembrava daquela música "a canoa virou, pois deixaram virar, foi por causa da ... que não soube remar"), e muita fé de que íamos chegar. Onde? Não importava. Qualquer terra firme e segura, longe de caranguejos gigantes e possíveis cobras e jacarés, que nos livrasse do pesadelo de ter pelo menos duas pessoas afogadas. Sim, duas mulheres não sabiam nadar e só sentimos falta do colete salva-vidas naquele exato instante.

Mas pra encurtar a conversa, depois de uma hora e meia "no limite", chegamos ao improvisado portinho da salvação. Alívio profundo. Caminhamos por entre uma floresta, passamos por alguns totens do antigo programa "NO LIMITE", e chegamos com a sensação de que o dia estava vencido. Ufa!

Mas pra não dizer que não falei de flores, na tarde deste mesmo dia, fomos a uma praia de rio, Pesqueiro, e outra, Barra Funda, nos deliciamos na água doce do rio apesar de rasa e barrenta. Os rios por aqui carregam muitos sedimentos nesta época do ano. Ah! Visitamos também um curtume, um ceramista, o comércio local, e almoçamos um filhote maravilhoso no Paraíso Verde. Carne de búfalo nem pensar por hoje.

Chegada a hora de voltar pra Belém. Depois de um domingo tranquilo, passado na pousada e imediações, Thierry nos levou de madrugada até a balsa pra pegar o micro-ônibus que nos atravessaria e levaria para a barca, e que depois de 3 horas de viagem alguém nos aguardaria no porto de Belém e nos levaria para o aeroporto. Lá pelas 3.30h da tarde de segunda estaríamos em casa. Ufa! Tem que ter fôlego pra ir pro Marajó.

Mas pensa que é só fôlego? Na, na, ni, na, não. Tem que que tem nervos também. No meio da viagem de volta pra Belém, nossa barca decide resgatar uma outra que havia ficado encalhada num banco de areia em plena baía. Como assim? Somos em torno de 600 passageiros, está chovendo, venta bastante, a maré ainda está baixa, corremos o risco de encalhar também e ainda temos que salvar nossos hermanos? Claro que sim, ética marítima, não podemos deixar outra embarcação sem socorro. E aí começa outro perrengue. Foram três as tentativas com uma corda que não me parecia forte o suficiente, mas que depois de vais-e-vens, tentando contornar os problemas de maré, areia, vento e o próprio peso, nossa embarcação conseguiu desencalhar a outra que por um bom tempo ainda tinha seu motor enguiçado. Foram uma hora e meia nesta tensão e na dúvida se conseguiríamos alcançar a tempo o voo em Belém. Felizmente, chegamos na hora do voo e sentamos, ainda molhados, nos assentos da TRIP. Molhados? Sim, esqueci de dizer que quando esperávamos para entrar na barca ainda em Camará, por volta das 6.45h da manhã, choveu chuva de vento e não teve guarda-chuva, nem telhado que impedisse o encharque total. Pintos molhados.

Bom, mas no balanço final, tenho a dizer que no Marajó, a maior ilha fluvio-marítima do Brasil, vimos um pouco de quase tudo, muito pouco mesmo, a ilha é graaaaaaaande demais, mas deu pra perceber que a vida por ali é dinâmica, apesar da quietude da gente, das casas, das ruas, de toda a cidade. Quem manda por lá não é o poder público, isto deu pra notar pelo descaso, descuido, abandono das ruas e construções. Quem manda por lá é a maré que traz água, muita água, e traz peixe, muito peixe, que cria búfalos, muitos búfalos, que alimenta a gente que teima em ficar, simplesmente porque é parte de lá assim como os pássaros, peixes, mangueiros, guaribas, preguiças, sararás, cobras, jacarés e muito mais. São parte deste Planeta Marajoara ainda tão desconhecido de nós brasileiros.


sábado, 31 de março de 2012

E no meio do caminho tinha uma castanheira


Hoje o tempo fechou, o céu está mais cinza que nunca, o silêncio é o maior que já ouvi, o ar está pesado apesar da leve brisa que insiste em dizer que a vida continua, a respiração está em descanso e dificulta o fluxo dos pensamentos, só uma pergunta ativa as conexões cerebrais: porque aquela centenária árvore caiu exatamente aos 40 minutos do dia 30 de março quando aqueles 11 trabalhadores voltavam de seus turnos?

O que nos coloca em determinados lugares, em determinadas circunstâncias? Seria o acaso ou algo que poderíamos ter feito para evitar? Mas como evitar que uma castanheira centenária deixe de cair sobre um ônibus com passageiros no meio do "nada"? "NADA"? Como assim, era uma floresta, cheia de árvores enormes, de raízes rasas, que caem todo dia, só que não presenciamos, não estão ao nosso alcance, são quilômetros e quilômetros de verde que tem sua própria dinâmica, suas próprias leis.

Nós escolhemos estar aqui. Conhecemos os riscos mas eles não nos impede de continuar neste lugar. A segurança chega a ser uma obsessão por aqui, ordem da empresa, diretriz prioritária a ser cumprida, mas no entanto, o acidente ocorreu e levou embora três funcionários e deixou outros nove feridos.

E ficamos assim paralisados, impotentes, diante deste fato - inevitável?

Fica então este sentimento de que estamos sujeitos, quer queiramos quer não, aos desígnios de uma força maior, que se expressa implacavelmente com uma árvore sobre nossas cabeças ou com um pensamento que interrompe o fluir da vida.

domingo, 4 de março de 2012

Entrando no clima







Assistindo ao Globo Repórter de sexta passada, percebi o quão familiar estou do que foi mostrado sobre a Amazônia. Me pareceu muito óbvio saber que aquele som, que o repórter tentava nos fazer adivinhar, era o do guariba, e não o som de um "ronco" como ele associou. Aquele era o grito inconfundível daqueles primatas. Só um leigo não saberia reconhecê-lo.

Como assim? Leigo? E eu sou lá alguma expert in Amazônia? Pois é... depois de um certo tempo neste mato-sem-cachorro, a gente fica meio sabidinha, e sabe o por quê? É só ir até a varanda e avistá-la, assim mesmo, bem perto, menos de cem metros a frente. Lá está majestosa, pomposa, intocável, verde como nunca, surpreendente nossa Amazônia.

Quando na reportagem, aquela onça pintada foi filmada à noite rondando o acampamento dos cientistas aventureiros naquelas bandas da Guiana, e o repórter fez o maior suspense como tendo sido um ato inédito, eu pensei... ora que coisa mais comum e sem graça. Sim porque na semana passada nosso geólogo-sempre-de-plantão me trouxe uma foto colorida da onça que ronda ininterruptamente o alojamento do projeto de cobre. Ela está à procura de carne humana, já que a última investida foi frustrada. A moça atacada está viva e apenas aguardando outra cirurgia plástica no rosto deformado pela mamífera. Ih, será fêmea mesmo?

Na reportagem, um dos cientistas diz que ficou surpreso de ver as araras tão de perto, seu colorido, sua beleza, era sua primeira vez, normalmente elas voam alto e só se vê uma mancha escura passando no céu. Engano dele, por aqui as araras pousam nas árvores e voam baixo nos deliciando com sua beleza e cantoria.

O tamanduá gigante que a cientista teve dificuldade em fotografar, já foi vista na estrada por nosso geólogo-sempre-de-plantão nas viagens aos projetos. Sem falar nas antas que podem ser vistas passeando livres no zoológico, ou as investidas em bando dos quatis nas mangueiras nos quintais das casas (eles adoram manga).

Uma das coisas que mais me surpreendeu numa das primeiras investidas pela floresta, logo que viemos morar aqui, foi uma minúscula perereca que encontramos na canga por onde passávamos. Um geólogo amigo a pegou e explicou que o que ela tinha de tamanho, não se comparava ao veneno mortal que continha. Assistindo a reportagem fiquei pensando no perigo que aqueles cientistas corriam ao pegar aquelas pererecas, não tão pequenas como a que vimos, mas talvez igualmente venenosas. Eles estavam maravilhados com elas.

Isto tudo pra dizer, que hoje já olho com outros olhos as reportagens sobre a Amazônia, e que me sinto muito mais próximo deste "planeta verde". Mas há um novo desafio que venho tentando vencer, e este sim, pode ser dos maiores: cantar no Kuarup.

Estou participando do Grupo Folclórico Kuarup. E sexta passada foi minha primeira apresentação cantando. Sim... ainda não me soa muito bem esta nova função, cantora, mas eles precisavam de gente, eu precisava de mais um motivo pra estar por estas bandas, eles toparam me ensinar, eu topei colocar a voz pra fora, então ficamos acertados. Depois de dois ensaios, lá estava eu com a cara mais lavada do mundo, tentando me entender ribeirinha no meio de tantas saias, e curimbós, e maracas, e banjo, e violão, e cordas, e flores, colares, brincos, maquiagem, e gente experiente que parece deslizar no passo do carimbó.

Acho que é preciso dizer que a apresentação foi boa, apesar de mim, e que continuo tendo a chance de melhorar. Potencial parece que tenho, agora é só treinar, treinar, treinar e treinar muuuuuito pra quem sabe me sentir muito desejada no grupo. Quanta pretensão, hein? Mas aprendi que muita coisa nesta vida é alcançada com motivação. E me parece que a motivação por aqui é questão de sobrevivência. Portanto, vamos à luta, vou correr atrás do talento, quem sabe ele está escondido nestes novos sons e imagens da gente Amazônica.